A dança é a forma de enxergar o corpo como uma
ferramenta criativa, é a arte que transforma o sentimento em movimento. Devido
a sua condição inerente à natureza humana sempre esteve presente nas sociedades,
desde as mais antigas até as atuais. Inicialmente era muito ligada aos rituais
religiosos, em especial os de fertilidade, o que expressa à busca pela harmonia
entre corpo e natureza. Ao longo da história passou por aprimoramentos,
codificações e mudanças, se dividindo em diversas linhas de interpretação. No
dia 29 de abril é comemorado o Dia Mundial da Dança, data que desde 1982
enaltece todas as formas artísticas que se manifestam através do movimento.
As danças têm origem popular, com
dinâmicas improvisadas e livres, que ao longo da história foram adaptadas pelas
classes dominantes. Graças aos triunfos, grandes festas protagonizadas pelos
nobres que emergiram na Itália com Lourenço de Médicis, que surgem nas cortes figuras fundamentais para o desenvolvimento
dessa arte: os mestres de dança. Cria-se assim, o embrião da dança como
espetáculo. A partir daí se observa um processo de codificação dos
movimentos, cujo marco é o tratado feito por Domênico de Piacenza no século XV, “Sobre a Arte de Dançar e
Dirigir Coros”.
Com o Ballet Comique de la Reine,
encomendado por Catarina de Médicis para
corte gálica, consolida-se a dança como forma de espetáculo. Essa visão atinge
seu apogeu na França do século XVII com Luís XIV. O Rei Sol, como era chamado o
monarca símbolo do absolutismo francês, foi o principal responsável pelo
desenvolvimento das artes e da cultura no reino. Uma de suas contribuições mais
significativas foi a criação da companhia de ballet da Ópera de Paris. É nessa
conjuntura que o aluno Jean Georges Noverre desenvolve suas ideias que para sempre revolucionariam o mundo
da dança.
Em 1760, com a publicação de seu
livro “Cartas sobre a Dança”, Noverre apresenta reflexões acerca da natureza e a liberdade dentro das
artes no decorrer de 15 cartas. Nelas, defende o ballet de ação,
uma obra que dependia do desenvolvimento dramático, ou seja, da coerência entre
enredo e personagens. Além disso, faz diversas críticas à forma como
o espetáculo era montado na Ópera de Paris, que se apoiava fundamentalmente no
virtuosismo de seus bailarinos e se desvinculava dos temas propostos. Essa obra
revela aspectos da dança que até hoje são muito importantes para o mundo
artístico por colocar questões como a ligação entre arte e vida, o
balanceamento entre técnica e expressividade e a relação entre racionalidade e
emoção.
Desde a primeira carta Noverre defende a dança como imitação da natureza, sendo ela a
responsável pela vida humana. Imitação essa não no sentido literal da palavra,
mas sim no âmbito de respeito as singularidades dos indivíduos. A dança deveria
valorizar as diferenças dos intérpretes e não buscar pela padronização deles, o
que entra em combate direto com o formalismo e a rigidez no ballet do século
XVIII. Dessa forma, ressaltava a importância da liberdade no processo criativo
e criticava quaisquer recursos limitadores como máscaras, perucas, roupas muito
pesadas e qualquer material que pudesse dificultar a interpretação.
Com pesada influência do pensamento
Iluminista, Noverre defendia
a harmonia entre as artes que compunham o espetáculo (cenário, música e dança)
e acreditava na necessidade de racionalidade, ou seja, o ballet precisava de um
“fio-condutor”, um início, meio e fim. Mesmo assim, ainda defendia a atuação
conjunta da emoção (interpretação) e da razão (técnica).
Essas ideais escritas no século
XVIII serviram de base para revoluções no meio artístico em todos os períodos
que se seguiram, o que deixa claro a contemporaneidade avançada
de Noverre, muitas vezes referido como “um homem à frente
de seu tempo”. Por causa de seu papel influenciador na história da arte e
principalmente da dança, foi acordado que o Dia Mundial da Dança seria
comemorado na data de seu nascimento, dia 29 de abril.