Para além da dança
A Escola Estadual de Danças Maria
Olenewa (EEDMO) foi criada com o propósito de formar bailarinos que
posteriormente viriam compor o corpo de baile do Theatro Municipal do Rio de
Janeiro, porém a formação em dança dos alunos da Escola proporciona diversas oportunidades
de carreira além do ofício de bailarino profissional. Como, por exemplo, a área
de fisioterapia, que também relaciona-se muito com a dança, sendo essencial
para a preparação corporal e cuidado dos bailarinos. E foi essa a carreira
escolhida pela Carol Lima, formada em dança pela EEDMO e fisioterapeuta.
Carol ingressou na EEDMO no
preliminar, primeiro ano da Escola, e se formou na turma de 1996, porém não
chegou a atuar como bailarina e começou a cursar a faculdade de fisioterapia
alguns anos depois. Seu interesse pela área iniciou-se ainda em seus últimos
anos da Escola de Dança. O olhar interessado para as correções e para as
diferenças físicas, como o porquê para algumas bailarinas era muito fácil
levantar a perna e para outras não e até comparando com suas próprias
dificuldades. Assim, começou a entender que as diferenças entre elas não se
resumiam simplesmente à capacidade das bailarinas. Durante a faculdade, seu
conhecimento em dança, principalmente nas aulas práticas, ajudou-a bastante devido
a sua experiência com os movimentos, sua coordenação motora e seu conhecimento do corpo, de forma a compreender
que movimento estava sendo falado e que
músculo que estava sendo mencionado pelos professores.
Carol começou a trabalhar como
fisioterapeuta com o público geral, dava aulas de pilates e de RPG e também deu
aulas de balé clássico, do básico ao nível médio, durante dezessete anos. Em
2019 parou de lecionar e já atendia alguns bailarinos como fisioterapeuta. Mas
foi na pandemia, depois da montagem de um curso de anatomia online, criado pela
escola de danças onde trabalhava, que seu contato com os bailarinos aumentou, o
que permitiu abrir uma parte da agenda para investir, se especializar e se
dedicar ao atendimento dos bailarinos, sempre relacionando anatomia e a dança e
criando o trabalho que desenvolve hoje.
Carol com Márcia Jaqueline
Atualmente, mesmo atendendo
bailarinos amadores, adultos, estudantes e pré profissionais, uma grande parte de seu público são bailarinos de alto
rendimento. Portanto, para esse atendimento é necessário também ter uma
abordagem desportiva e acompanhar os
bailarinos nas temporadas, somado ao olhar da especificidade, ou seja, entender
de balé, saber, por exemplo, o que é “en
dehor”, saber como é subir nas pontas e, nesse ponto, sua vivência facilita
muito a comunicação com os bailarinos também, visto que as sensações durante um
passo podem ser melhor definidas e compreendidas por ambos os lados da relação
fisioterapeuta-bailarino. Quando um dançarino apresenta uma lesão, o processo
de reabilitação é o mesmo daquele para uma pessoa comum, a diferença é o
momento em que o bailarino vai focar a sua recuperação para o ganho de força
específica à tarefa, ou seja, este processo se estende até que ele consiga
voltar a fazer todos os movimentos complexos do balé novamente. Além disso, a
experiência da Carol como bailarina apresenta-se como um diferencial quando
precisa entender o mecanismo que gerou uma lesão crônica, lesão por esforço
repetitivo, não provocada por um acidente.
O atendimento aos bailarinos de alto
rendimento durante a temporada é um desafio, segundo ela. As sessões podem
focar em melhorar o desempenho em palco, trabalhando funções específicas de
algum balé, ou em tratar uma lesão. Nos casos de lesões, por vezes, é
necessário diminuir a carga de exercícios e não fazer determinados movimentos
para que o bailarino termine a temporada. E, quando o intuito é melhorar o
rendimento, é necessário calcular a quantidade de carga dos exercícios da
fisioterapia levando em conta a quantidade de ensaios que o bailarino tem. O
ideal é que a preparação para um balé comece antes dos ensaios, uma vez que nas
baixas da temporada, o fisioterapeuta não encontra o bailarino cansado, assim
os exercícios podem ter uma carga maior, visando a preparação do corpo. Desse
modo os bailarinos se previnem para estarem no seu ápice corporal, para darem o
melhor de si nas apresentações, não apenas para não se machucarem ou tratar de
alguma lesão, mas para estarem melhor a cada temporada.
Recentemente, a primeira bailarina
do Theatro Municipal e ex-aluna da Escola de Dança Maria Olenewa, Marcia
Jaqueline, sofreu uma lesão no joelho e desde então está em tratamento com a
Carol. Sua reabilitação está no estágio
final, ou seja, focada no ganho de função dentro do balé, para que ela consiga
voltar a realizar todos os movimentos complexos de sua atividade sem dor ou
disfunção no joelho. Assim, Márcia está tendo uma exposição gradual à
complexidade, que começou com o primeiro
plié pós lesão e se estende até o retorno da bailarina a sua rotina. É
importante ressaltar o cuidado, o tempo e o trabalho que esse retorno exige,
pois, por exemplo, mesmo após a bailarina conseguir realizar os movimentos sem
dor é preciso lidar com um corpo que naquele momento precisa de um tempo maior
para reagir, visto que numa aula e ensaio de balé, a sequência de passos, a
música a ser seguida, o espaço, as correções passadas, são fatores que existem
na rotina da dança e que juntas aumentam a exigência do corpo do bailarino em
reabilitação, por isso também são introduzidas sob a orientação da
fisioterapeuta.
Portanto, para a Carol Lima, todas
as aulas de balé de sua vida, seja como professora ou aluna da EEDMO, foram e
são essenciais para sua profissão hoje, fora o aprendizado contínuo com a troca de experiências com os bailarinos e
ao assisti-los no palco. Ela diz que para tratar de bailarinos, além de ser um
fisioterapeuta completo, é necessário entender profundamente de balé clássico.
Sua escola de formação, a Escola
Estadual de Dança Maria Olenewa, além de bailarinos, busca formar cidadãos,
seres humanos melhores, capazes de atuar em diversas áreas do conhecimento.
Texto baseado numa entrevista
concedida a Laura Fayer, aluna do primeiro técnico da EEDMO, pela
fisioterapeuta Carol Lima.
Por Laura Fayer