domingo, 9 de agosto de 2015

Por trás da cena - Irene Orazem

Uma história escrita com emoção e suor

Irene Orazem ou “Tia Irene” é uma figura muito conhecida dentro do Theatro Municipal do Rio de Janeiro. Gênio jovial e alegre, sempre muito solícita e disponível, com sua fala modesta, pouco deixa transparecer a magnitude de sua história dentro da dança, que a faz ser muito querida por todo o corpo de baile e sem dúvida muito respeitada. E não é para menos, já que são 67 anos de casa, que vão desde o seu ingresso na escola de dança em 1948 com 8 anos de idade, até os dias de hoje trabalhando na produção na divisão de dança.

O Tour Em L’Air hoje, através dessa pequena entrevista, presta essa homenagem a sua ex-aluna e bailarina, Irene Orazem, que é merecedora da mais alta conta dentro do mundo da dança e principalmente dentro do Theatro Municipal, sua casa, onde vivenciou grandiosas experiências e contribuiu ( e continua contribuindo por trás da cena) imensamente para escrever com muito suor a trajetória da dança em nosso país. 


Irene Orazem

Segue nossa entrevista:

Tour: De que forma a escola de dança contribuiu para sua formação como bailarina?

A escola foi de total importância para mim. Tive a sorte de ter por cinco anos Dna. Luiza Carbonel uma das melhores professoras que a escola teve. Ela me ensinou tanto a técnica como a disciplina necessária para ser bailarina (aliás, para mim, o principal quesito para se formar um bailarino é a disciplina). Depois que Dna. Luiza saiu da escola (muito injustamente), a turma ficou por dois anos com Dna.Renne Wells.

Acabei os meus dois últimos anos já no corpo de baile, onde ingressei com 15 anos por concurso com apenas 4 vagas. Nesta época a direção era de Tatiana Leskova e felizmente tínhamos sempre os grandes coreógrafos da época montando ballets de repertório para o Theatro Municipal.

Tour: Conte-nos um momento muito feliz e outro nem tão feliz da sua carreira como bailarina.

Os meus momentos mais felizes foram sempre aqueles quando estava em cena, fazendo solo, um bom corpo de baile, uma linda ópera, muita televisão e até cinema. Lamento que, há muito tempo os bailarinos já não possuem tanto campo de atuação como antigamente, isso ajuda muito para a profissionalização e o amadurecimento do bailarino. Manter-se financeiramente sempre foi uma dificuldade para nós bailarinos, o que obrigava-nos a fazer muitos trabalhos para sobreviver e como você sabe, até hoje isso não é muito diferente. Os fatos mais tristes na minha carreira foram vários problemas de deslocamento de rótula que tive e que ocasionaram uma grande cirurgia que poderia por fim à minha carreira logo no início. Felizmente não aconteceu, e ao contrário, tive mais garra para voltar ao palco, e olha que os tratamentos que existiam na época não eram tão eficientes como os de hoje. Tive várias direções, sendo que em 1977, o corpo de baile teve uma grande e feliz mudança com Jorge Garcia.

Outra alegria para mim foi em 1981, pois aos 41 anos tive que fazer uma prova de classificação sob a direção de Dna. Dalal Achcar e passei como solista. Ainda tive a sorte de dançar todos os grandes ballets que foram remontados nessa época.

Irene Orazem a 3° da direita para esquerda

Irene Orazem

Tour: Conte-nos um pouco mais da sua experiência como ensaiadora e professora do corpo de baile.

Depois que passei como solista segui o caminho natural, assistente de coreógrafa, professora do corpo de baile e por três anos professora da Escola de Dança (EEDMO), finalmente por problemas ortopédicos, tive que parar e há 10 anos estou na Divisão de Dança e responsável pela produção junto com algumas de minhas colegas “ex-bailarinas” como eu.

 Matéria a respeito das montagens de "Le Preságes, Suite en Blanc e Grand Pas Classique"
 em pé Boris Storojkov em cima Irene Orazem,
em baixo Tatiana Leskova e João Wlamir sentado.


Tour: A Sra. é uma das poucas bailarinas que mesmo depois de dançar continuaram a trabalhar no Theatro por longo tempo e até os dias atuais. Porque essa decisão de continuar atuante no Theatro?

Tenho o maior prazer em conviver com jovens, como você e outros, que me revigoram. Sinto-me em uma constante troca de experiências. É uma mistura de artes e gerações, por isso dou muito de mim, mas também recebo muito.

Tour: Quais as principais diferenças da dança nos dias de hoje, para a dança de sua época?

A principal é que dançávamos mais. Como nossa CIA é de repertório, acho que temos que apresentar os grandes ballets e dar espaço para os grandes coreógrafos da atualidade mostrarem seu trabalho.

Irene Orazem no meio junto com o atual corpo de baile do Theatro Municipal do RJ
(foto do arquivo pessoal de Bárbara Lima)


Tour: Em momentos de certa tensão para a escolha do novo diretor do corpo de baile, quais suas expectativas para essa nova fase do Theatro e para os jovens que estão ingressando nessa carreira?

No momento estamos passando por um momento muito difícil, sem direção e sem expectativas. Aliás, não é só o ballet e sim toda a FTM que está numa situação muito triste, reflexo da desvalorização da cultura do nosso país. Tudo isso me entristece muito, por isso não sei bem o que dizer para quem está iniciando esta carreira tão difícil. Mesmo assim, sempre tenho esperança, senão não estaria há 67 anos, desde o período escolar, vivendo tudo isso.

Irene Orazem e Bruno Fernandes
(foto do arquivo pessoal de Vanessa Pedro Menezes)


Obs: Algumas horas depois de realizarmos a entrevista com Irene, recebemos a notícia que Ana Botafogo e Cecilia Kerche eram as mais novas regentes do corpo de baile do Theatro Municipal. Irene me envia uma mensagem no Facebook declarando o seguinte:

"Acabo de saber da notícia da nova direção, e como te disse, eu sempre tenho esperança."



O tour En L’Air continuará cumprindo com seu papel de reviver e homenagear os nomes que tanto contribuíram para o desenvolvimento da dança, trazendo sempre à memória os que trabalham por trás da cena.
Viva, Irene Orazem que para mim, com todo afeto, será sempre a amorosa Tia Irene.

Luan Limoeiro

3 comentários:

  1. Mais uma vez o Tour En L'air acertou em colocar uma personalidade como a bailarina Irene Orazem que representa todo um ciclo de glória do Theatro Municipal.. Na entrevista Irene soube com poucas palavras elucidar e contar toda sua trajetória artística que se entrelaça com a história do T.M é assim as próximas gerações podem ter uma ideia do que foram esses 67 anos de trabalho e conquistas artísticas. Irene é a representante real de uma época de todos aqueles que participaram

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  2. Tia Irene arrasa!!! Um show!! 👏👏👏👏

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  3. Uma excelência! Nem sei o que falar sobre essa pessoa:ou seja, somente elogios. Uma profissinal dedicada, estou aprendendo muito com ela, conhece muito todos os figurinos, e quanto à pessoa, um ser humano iluminado, expetacular! Sempre generosa!

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